«Somos chamados ao trabalho desde a nossa criação. Ajudar "pessoas em situação de pobreza", deve ser sempre um remédio provisório. O verdadeiro objectivo deveria ser sempre consentir-lhes uma vida digna através do trabalho» Laudato Si: página 88.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Vida de Ozanam (XI)

Defensor da democracia e dos direitos trabalhistas

Nas épocas de agitação entre os homens, Deus suscita iluminados que apontam meios para uma reforma de costumes. Ozanam foi designado pela Providência para advertir transviados e ajudar os necessitados de amparo. Como acontece com todos os profetas, não foi compreendido. Quando ele afirmava que, além da esmola, obrigação de todos, o povo precisava de instituições que o tornassem melhor, o que se conseguiria com a introdução da democracia, muitos viam nele um agitador.

O pensamento de Ozanam, exposto em seus escritos, convence que ele, possuía a visão do futuro. Antevia os acontecimentos. “Hão de surgir novos céus e novas terras” e “diante da realidade, o primeiro dever do cristão é não atemorizar-se, e, o segundo, não atemorizar os outros. Perante as crises políticas e acima delas está a Providência”. “Aprendi da História que a Democracia é o termo natural do progresso político, deixando assegurada a liberdade da Igreja”.

A presença de Ozanam junto às classes desprotegidas nele desenvolvia elevado senso social. E do apostolado da Caridade ao apostolado social não houve quase intervalo. Como Professor de Direito Comercial penetrou fundo no problema da vida operária, apontando soluções depois aproveitadas na encíclica RERUM NOVARUM, de Leão XIII. Foi ele que esclareceu o “justo salário”, afirmando haver exploração quando a retribuição real do assalariado é inferior às suas necessidades normais.

Ozanam já afirmava em 1836, que “a questão que divide os homens é uma questão social, restando saber se a sociedade será a exploração em proveito dos fortes ou uma consagração para amparar os fracos. Há os que possuem demais e os que nada possuem. Estes acabarão tomando aquilo que lhes estão negando. Uma terrível luta se prepara entre essas duas classes: de um lado o poder da riqueza, do outro o poder do desespero”.

Momentos turbulentos na Europa

A humanidade vivia angustiada. Revoluções políticas, desordens sociais, lutas de classes levaram à anarquia vários países. Ozanam convocava os cristãos para se colocarem entre os dois campos em luta, campos por ele apontados desde 1836. Os católicos não lhe deram ouvidos. Preferiram permanecer insensíveis, esquecendo os oprimidos. E o resultado foi o Manifesto Comunista de Karl Marx, lançado em fevereiro de 1848. Não quiseram ouvir o arauto da Igreja, iriam sofrer os golpes dos comunistas.

Com a revolução republicana de 1848, viram-se os vicentinos envolvidos na luta sangrenta, procurando defender a Democracia nascente, que estava sendo ameaçada pelos aproveitadores da situação, desejosos de transformar o movimento em intentona comunista. Ozanam, que sempre defendera os operários, explorados pela burguesia capitalista, procurou colocar-se entre os dois campos, como ele sempre aconselhara, a fim de afastar o perigo vermelho e atrair os transviados para o bom caminho.

Novo presidente do Conselho Geral é ferido gravemente em combate

A direcção da Sociedade de São Vicente de Paulo acabara de receber novo Presidente Geral. Gossin renunciara o cargo por motivo de doença grave, sendo eleito em 14 de Fevereiro de 1848 o confrade Adolpho Baudon, de 28 anos, “jovem, activo, dedicado às obras”. Para defender a Democracia, sob os ataques dos vermelhos, Baudon alistou-se na Guarda Nacional, o que também fez Ozanam; enquanto combatia bravamente numa posição
avançada, Baudon foi gravemente ferido na perna.

A participação dos vicentinos na refrega sangrenta justificava-se pelo desejo de atrair para a Igreja as simpatias dos republicanos. Isso foi alcançado, com a posterior revogação de todas as leis que entravavam as actividades religiosas. Mas custou o sacrifício de muitas vidas de vicentinos, a invalidez de Baudon, que ficou coxo, e, pior de tudo, a morte do grande Arcebispo D. Affre, ferido a bala, enquanto, tentava a pacificação entre os combatentes.

A morte de Dom Affre trouxe paz aos franceses

Quando maior era a luta nas ruas de Paris, resolveu Ozanam pedir a intervenção do Arcebispo, D. Affre, como pacificador. Este aceitou prontamente, apesar dos perigos da empresa.

Ozanam quis acompanhá-lo, mas ele o dissuadiu, pois estava fardado. Antecedido de um vicentino, com a bandeira branca, o Arcebispo foi bem recebido pelos rebeldes. E já se tinha por conseguida a paz, quando um tiro, vindo de longe, o feriu de morte.

Todos lamentavam e condenavam a dolorosa ocorrência, fruto de inominável traição. O Arcebispo enfrentou o desastre com santa calma, dizendo que o Pastor dava a vida pelas suas ovelhas, e esperava que o seu sangue fosse o último a ser derramado.

Faleceu assistido pelo jovem Carlos, médico, irmão de Ozanam. Os vicentinos choraram a morte do Arcebispo, seu grande amigo e protector. Como ele previra, o sacrifício de sua vida trouxe a paz aos franceses.

Ozanam, vice-presidente do Conselho Geral, faz circular o Boletim da Sociedade

O grave ferimento sofrido por Baudon quase que o fez perder a perna que ele, apesar de horríveis sofrimentos, não permitiu amputassem. Levou, seis meses para relativo estabelecimento, ficando aleijado e suportando padecimentos intermitentes. As sessões do Conselho Geral realizavam-se na residência dele.


Enquanto isso, Ozanam, Vice-Presidente, assumia todos os encargos exteriores fazendo circular, pela primeira vez, em 15 de Julho de 1848, o BOLETIM da Sociedade, até agora espalhado pelo mundo inteiro.

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