«Somos chamados ao trabalho desde a nossa criação. Ajudar "pessoas em situação de pobreza", deve ser sempre um remédio provisório. O verdadeiro objectivo deveria ser sempre consentir-lhes uma vida digna através do trabalho» Laudato Si: página 88.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Modelo Família Vicentina - Luis de Mello Breyner

Luis de Mello Breyner
(1807 - 1876)

"O Homem-Conde Sobral" 
O Primeiro Presidente da Conferência de São Luis-Portugal.

Sendo o terceiro filho, Luís de Mello Breyner, nascido a 26 Outubro 1807 e falecido a 01 Setembro 1876, foi o segundo Conde de Sobral pelo seu casamento com D.Adelaide Braamcamp Sobral de Almeida Castelo Branco, de Narbonne-Lara. Casaram em 06 de Outubro 1834. Foi Grã-Cruz da Ordem de Cristo, Comendador de Torre e Espada, Cavaleiro de São Bento de Aviz,. Condecorado com a medalha de Oiro das Campanhas de Liberdade e com a de Valor, Bons Serviços e Comportamento exemplar, Par do Reino, coronel do exército, ajudante de campo do prícipe D. Augusto de Leuchtenberg, primeiro marido de D. Maria II e depois de D.Fernando de Saxe Coburgo Goth, segundo marido de mesma Rainha.
  Foi inicialmente educado no Colégio dos Pobres do Espírito Santo e, em 29 Novembro 1826, assentou praça em cavalaria 4.
  Em 1833, recebia a Torre e Espada. O Rei D. Fernando, a quem serviu vários anos, tinha por ele a maior estima.
  Afastou-se da política, dedicando-se ao melhoramento das sua propriedades agrícolas, considerando isso o melhor que podia fazer à Pátria e àqueles que aí trabalhavam.
  Em 17 Maio 1851 aceitou o cargo de Governador Civil de Lisboa, cargo que exerceu até 24 Agosto 1852, data em que pediu a demissão. A Grã-Cruz da Ordem de Cristo foi-lhe então concedida pelos trabalhos que aí exerceu. Voltou a ser Governador Covil de Lisboa de 28 Agosto 1856 a 02 Agosto 1858, tendo uma parte muito activa no reinado de D. Pedro V, se deram as grandes epidemias que assolaram Lisboa.

O Presidente da Conferência

  Não se absorvia, porém, tão completamente o Conde de Sbral nos negócios da sua casa que lhe não sobrasse tempo para se dedicar a outros misteres. Os deveres da caridade nunca o reclamaram debalde. Era o servo dos pobres, dos aflitos, dos desprotegidos e valia-lhes sempre, em todas as ocasiões, com o seu dinheiro, com os seus conselhos, com o seu préstimo. A pequena mesada que recebia (e nisso foi sempre escrupuloso até ao excesso) era toda despendida no favorecimento dos necessitados. Muitas vezes se privou alguns cómodos de vida, para não privar a outrem de algum socorro. Respeitava a probreza e, para a servir, largava tudo, como se tudo fora inferior a esta dignidade que é tão eminente, no dizer de Bossuet. Todos os dias o procuravam bastantes pessoas, para lhe pedirem esmola umas, outras para lhe pedirem pareceres e conselhos, que esmolas também são e, das que mais devemos agradecer.Dedicava as horas da manhã a este piedoso ofício e dele não largava mão até a todos ter despachado. Só depois da sua morte, é que pode saber-se a extensão e valor dos seus benefícios, tão rigoroso era o segredo que sobre eles guardava e mandava guardar aos interessados.
  À sua iniciativa se deveu a organização em Portugal das Conferências de São Vicente de Paulo, esse prodigioso instrumento de caridade para o corpo e para a alma. Foi o primeiro presidente da primeira Conferência portuguesa quis-lhe com o entranhado carinho de pai. Não se poupou a esforços para que na nossa pátria se aclimatasse esta formosa árvore, que tão abençoados frutos tem produzido onde se radicou. Trabalhou desveladamente para este fim. Pregava com a palavra e com o exemplo.
Nos começos pôde congratular-se que lograria o seu intento. Aumentava o pequeno núcleo dos primeiros dias, cresciam os bens que da Conferência instituída, começava o povo a amá-la e a respeitá-la. Por esta época apareceu a triste questão das irmãs de caridade. Tanto bastou para arruinar pela base os esforços do Conde. A Conferência ornava-se com o nome de São Luís; era espiritualmente dirigida pelos padres lazaristas; congregava-se no edifício de São Luís: nesta Igreja celebrava as sua festas. Não atendeu a mais nada a opinião que então dominava. Envolveu na mesma impopularidade a Conferência de São Vicente de Paulo e a sociedade secular que, sob a sua protecção e inspirando-se do espírito de caridade, curava de aliviar as misérias do corpo e de minorar os sofrimentos da alma. A Conferência é uma criação dos lazaristas, diziam os seus inimigos, é o modo disfarçado de nos impor as Filhas da Caridade, é um perigo para as instituições liberais, não deve tolerar-se. E, de facto, nunca pôde conseguir-se que ela tivesse existência legal.
  Trite cegueira foi esta e muito para lastimar. Os acrisolados defensores da liberdade mostravam-se mais descrentes nela do que os seus inimigos. Julgavam ver perigos no exercício de um direito que é princípio de liberdade. Esta é felizmente robusta e não sucumbiu aos repetidos golpes com que lhe cavavam a sepultura os que mais clamavam que a estavam consolidando. Os verdadeiros liberias curvaram a cabeça e deixaram passar a onda. Não havia que discutir. Na verdade era irrisório supor que o regime liberal corria perigo porque alguns homens se juntavam para rezar, coligir esmolas entre si, visitar os pobres, consolá-los, ensinar-lhes os seus deveres de cristãos e minorar-lhes as misérias. Neste programa estava a defesa da Conferência de São Vicente. O conde de Sobral sentia pois a sua consciência de liberal perfeitamente tranquila, ao passo que tinha tão intimamente satisfeita a sua consciência de católico. Não se enganou, porém, acerca da Conferência, nem conservou a ilusão que a principio tivera de nacionalizar esta instituição. Contudo, nem abandonou nem sequer afouxou o seu zelo. Serviu a Conferência enquanto ele durou. Dissolvida por falta de membros, foi o último a retirar-se, como o comandante de um navio é o último a sair do seu bordo, quando o naufrágio exige o abandono do barco.
  Não era, pois, tão somente teórico o catolicismo do conde. Respeitava a religião e seguia-lhes os preceitos, Deu várias provas ao longo dos anos seguinte, participava em muitas ocasiões angariando fundos. O seu bom carácter e severidade dos seus princípios muitas vezes era escolhido para conselheiro ou arbitro nas questões de defesa de famílias. Foram frequentes os casos em que o conde foi chamado a dar o seu parecer em assuntos que podia perigar a honra de alguém. Era consultado como se fora o juíz que melhor conhecesse os preceitos que regulam tão melindrosas e delicados casos. O Conde de Sobral na sua intimidade da vida de todos os dias, era simples, franco e de bom trato, modesto no traje. Para os amigos tinha o coração sempre aberto. Para ele, a amizade não era palavra vâ; era um sentimento verdadeiro que ele sabia expressar em actos, até com sacrifício próprio, quando assim era necessário.
  Falava sempre com a máxima reserva e era neste ponto inexcedível a sua prudência. Ninguém conservava melhor um segredo. Fugia de ouvir confidências, mas tinha a rara e difícil qualidade de as guardar para si, quando porventura lhas confiavam.
  Raras vezes se deixava arrebatar da ira e nunca por motivos fúteis. Havia perfeitamente domado o seu génio naturalmente fogoso. Escravizava o temperamento em vez de ser por ele escravizado. Diante de uma acção mesquinha ou vil, dava largas à sua cólera; era tremendo quando fulminava a injustiça ou quando lançava em rosto a um infame toda a abjecção da sua conduta. Quando sucedia exceder-se sem motivo plausível e que satisfizesse a sua consciência, penitenciava-se espontaneamente e não se envergonhava de pedir perdão a quem julgasse haver ofendido, fosse qual fosse a posição da pessoa perante quem se humilhava.
  ... Terminados os piedosos actos assombrou-se de novo esta inteligência há pouco ainda tão clara e rebusta e só voltou a conhecer-se na presença de Deus e à luz do eterno dia, que para ele despontou em 11 de Setembro de 1863.
  Entre os papéis do Conde de Sobral encontrou-se um breve escrito e que narra, com a sua habitual concisão e singeleza, a doença e morte de seu filho.
  Luis de Mello Breyner nunca fora mundano no sentido vulgar da palavra, nunca fora dado a divertimentos estouvados, mas como homem de bom senso que era, não fugia aos deveres que a posição impõe e as relações de amizade criam. O Conde nunca soubera o que eram respeitos humanos. toda a sua vida cumprira franca e abertamente os seus deveres religiosos, nunca escondera os seus sentimentos de verdadeiro cristão, nem para comprazer com certas ideia hoje tão vulgares; fazia mistério da sua fé. A Sua dedicação pelo Sumo Pontífice; a sua ardente simpatia pela sociedade São Vicente de Paulo; o zelo com que olhava pelo culto do Santíssimo Sacramento na freguesia de Santa Isabel; a devoção a Nossa Senhora eram verdadeiramente edificantes.
  Era seu confessor o Padre Miel, amigo a quem desvendou os mistérios da sua vida, as faltas e fraquezas a que, como homem, estivera sujeito. Antes da morte, mas quando já estava muito mal, foi visitado pelo Núncio Apostólico que lhe levou uma bênção especial do Santo Padre. Oito vezes se lhe rezavam as orações dos agonizantes. Em todas elas, menos na última, seguiu atentamente todas as palavras que em volta dele se proferiam.
         




terça-feira, 25 de agosto de 2015

Modelo Família Vicentina - Jean-Léon Le Prévost


Jean - Léon Le Prévost
(1803 - 1874)

UM HOMEM TODO CARIDADE

Le Prévost foi vicentino muito actuante em sua época. Foi por sua sugestão que as Conferências de Caridade passaram a chamar-se Sociedade de São Vicente de Paulo. Anos depois, ele funda uma congregação de padres e irmãos intitulada Religiosos de São Vicente de Paulo. Nos tópicos abaixo temos um resumo da sua vida.

Infância e juventude

  Os Le Prévost constituíam uma das mais antigas famílias da cidadezinha de Caudebac - en - Cax., na Normandia (França), situada nas margens do rio Sena. Seu pai, Jean Louis Claude Le Prévost, exercia a profissão de titureiro e branqueador de algodão. Casou-se no dia 9 de Maio de 1802 com Françoise Pitel. Deste casamento nasceram dois filhos. Um ano depois do nascimento de Maria, a irmã mais velha, nascia Jean-Léon, em 10 de Agosto de 1803.
  Jean-Léon não tinha ainda um ano no momento da morte de sua mãe. Em 1805, seu pai casa-se, em segundas núpcias, com Marie Françoise Rosalie Duchatard. Esta mulher ocupa um lugar importante na vida e na educação de Le Prévost. Ela foi uma «verdadeira mãe» para ele. É o testemunho que Prévost dará desta mulher que ele cercará com o seu afecto até à sua morte, ocorrida em 1845. Ela estava com 42 anos à época do casamento. O casal não teve filhos. Na idade dos três anos, Le Prévost sofreu uma queda que lhe causou uma enfermidade na perna direita. O mal exteriormente é pouco sensível, mas a extrema fraqueza da perna obriga-o a parar frequentemente. Ele recorrerá ao uso da bengala para fazer as suas «corridas de caridade» nas ruas de paris ou na periferia. Sua mãe, muito piedosa, lava-o aos santuários da região, na esperança de obter da Virgem uma possivel cura. Retirado em Chavile, Le Prévost, nos seus últimos anos, lembrava com emoção as longas caminhadas de oração e fé de sua infância: «permaneci coxo, mas, sem duvida, é a todas as preces de minha mãe que devo o pouco amor a Deus que está no meu coração».
  A infância de Le Prévost passa-se sob o Império de Napoleão I. Na época, o ensino deixava muito a desejar. Le Prévost recebe as primeiras lições junto de um padre laicizado e algumas senhoras, primas de sua mãe. Le Prévost deixa, aos 16 anos, os seus estudos, pois precisava de trabalhar. Encontra um emprego de copista. Um gesto dá testemunho de seu amadurecimento - renuncia à sua parte de herança em favor da sua irmã: «Que a minha parte seja junta à de minha irmã, para lhe constituir um dote; para mim a minha educação me basta». O sofrimento de seu pai não terá sido inútil pois te-lhe-á possibilitado o saber colocar-se no lugar do pobre, do humilde, do rejeitado.

Le Prévost e a SSVP

Em 1831 desembarca em Paris o jovem António Frederico Ozanam, filho de um médico de Lyon. Este brilhante aluno deseja preparar o seu mestrado em Direito. As suas convicções religiosas, e a sua grande inteligência e a sua autoridade pessoal fazem dele o lider dos jovens estudantes católicos. Ele faz amizade com Lacordaire e escreve no jornal de Bailly, como Jean-Léon Le Prévost. os dois homens encontram-se no jornal «La Tribune Catholique» na casa de Emmanue Bailly seu proprietário e redactor-chefe.
  Ao completar 20 anos, em 23 de abril de 1833, Ozanam reúne, com Bailly, muitos outros companheiros: Lamanche, Le Taillandier, Devaux e Lallier. Encorajados pela Irmã Rosalie, estes jovens estudantes desejam manifestar a sua fé através de uma reunião literária, dirigida por Bailly, numa associação devotadamente aos pobres. Ela destinava-se a «demonstrar aos deístas, aos cépticos e aos filósofos a vitalidade da fé».
  Le Prévost encontra Ozanam e os seus companheiros, não somente no escritório de Bailly, mas também num pequeno restaurante: «Eles comiam comigo. eles eram animados e um pouco barulhentos. Amante do silêncio eu temia-os um pouco». Um dia um deles dirige-se a Jean-Léon e, após um maior conhecimento mútuo, é-lhe proposto juntar-se ao pequeno grupo recém-constituído sob o nome de «Conferências da Caridade».
  Estamos mo mês de Agosto no momento de separação para férias. Em outubro seguinte, Le Prévost é atingido pela cólera e a sua convalescença prolonga-se por todo o mês de Novembro. Só estaria presente na Conferência da Caridade no dia 17 de Dezembro de 1833, como testemunharam as actas do Secretário-Geral Chaurand. Naquela época os vicentinos já eram 15. Dois meses mais tarde, em 4 de Fevereiro de 1834, Le Prévost pede «que a Sociedade se coloque sob a protecção de São Vicente de Paulo e celebre a sua festa, além de uma oração feita no início e no fim de cada reunião».Esta proposta correspondia aos desejos do conjunto dos vicentinos e, em particular, de Bailly, cuja família venerava «Monsieur Vicent» É na assembleia de 8 de Dezembro de 1834 que o nome «Sociedade São Vicente de Paulo» é escrito pela primeira vez.
  A visita aos pobres, aos jovens presos, a responsabilidade assumida para com um grupo de órfãos, são outras tantas actividades em que encontramos o vicentino Le Prévost, que não esconde o seu entusiasmo, que se reflecte nas cartas da época «Não saber a quem recorrer, com quem se entender, a fadiga, a vertigem e, depois, quando se deixa tudo, por esgotamento, ver tudo, à mercê do bom Deus, correr melhor e, chegar sem a gente, ao objectivo...».
  Vivendo geralmente longe de Paris, António Frederico Ozanam recusou o cargo de Vice-Presidente em 1835 - também em 1840 - e é Le Prévost que ocupa este a partir de 8 de Dezembro de 1835 até 1839. No ano de 1835, o conselho Directivo desdobra-se em dois : Conselho geral e Conselho de Paris.
  Le Prévost, membro do Conselho Geral, dele participará até Outubro de 1835. Como Presidente da Conferência Sant-Suplice, é membro de direito de conselho de Paris. Durante mais de uma dezena de anos, nele desenvolverá todos os seus talentos de animador e organizador.

Leigos trabalhando  

  Nascido desta «querida Sociedade de São Vicente de Paulo», o Instituto de Jean-Léon Le Prévost tinha aprendido o que era apostolado leigo. Os primeiros membros desta família religiosa tinham iniciado a caridade nas obras da Sociedade de São Vicente de Paulo. Esta experiência tornava-se o ponto de partida de uma acção missionária rejuvenescedora e o início de uma tomada de consciência dos problemas socais da época.
  Em 1874, o Instituto contava com 64 religiosos empenhados no trabalho apostólico em 11 comunidades. Eis o segredo deste sucesso: «Os esforços deste pequeno número de homens são multiplicados na prática das obras por um processo que caracteriza o espírito do Instituto e, que consiste em fazer agir em toda a parte, ao redor de nós, um certo número de homens de classe dirigentes que se instruem e se santificam, colaborando com os religiosos. Pode avaliar-se em 300, mais ou menos, o número destes auxiliares».
  Ozanam tinha razão de querer preservar as Conferências do controlo clerical e conservar-lhe o seu carácter leigo. O vicentino Le Prévost e o seu Instituto reconheciam a autonomia das associações leigas, colocando-as no conjunto da vida eclesial.
  Le Prévost descobriu muito cedo e em grande parte graças à Sociedade São Vicente de Paulo, que os leigos são membros por inteiro desta grande família eclesial, que são uma vanguarda missionária e chamados à perfeição evangélica.
  Caridade é doação, entrega, despojamento. Para atingirmos a santificação devemos vivê-la. Assim Le Prévost definiu caridade:«Caridade: que palavra e que coisa sublime!... Como o bom Mestre fez um lindo presente ao mundo quando veio trazer este fogo divino! Possamos, segundo seus desígnios, acendê-lo em seu nome ao redor de nós».

Resumo da vida de Le Prévost

1803 - Nascimento (10 de Agosto - Normandia).
1803 - Baptismo (7 de setembro).
1825 - Conhece Victor Hugo, Lacordaire e Montalembert.
1833 - Ingressa na SSVP.
1836 - Primeiro presidente da Conferência de Sant-Sulpice.
1840 - Membro do Conselho Geral da SSVP.
1844 - Fundador da «Obra da Sagrada Família».
1845 - Fundador dos «Religiosos de São Vicente de Paulo».
1860 - É ordenado sacerdote (22 de Dezembro).
1874 - Falecimento (30 de Outubro em Chavile).

  

   

domingo, 23 de agosto de 2015

Modelo Familia Vicentina - Léon Papin Dupont

Léon Papin Dupont
«O Santo Homem de Tours»

  A vida de intensa piedade e de confiança absoluta no poder da oração, que caracterizou o «Santo Homem de Tours», também conhecido pelo «Servo da Santa Face» e pelo «Traumaturgo de Tours», tentou os biógrafos a um dos quais, L. Baudiment, Superior do semanário Maior de Tours, vamos respigar alguns traços marcantes de tão extraordinária influência sobrenatural, desenvolvida no século de Taine e de Renan.
  Nasceu ma Martinica, de família nobre, originária da Bretanha . Papin di Pontcallec - que ele, modestamente e apenas interessado na genealogia que o tonava filho de Deus e irmão de Nossa Senhor e dos Santos, simplificou para o banalíssimo «Dupont».
  Feitos os primeiros estudos na escola local, seguiu para os EUA e logo que voltou a paz ao mares, para França onde no Colégio de Pontlevoy, deu as primeiras provas de carácter: surpreendido um dia o curso que fazia parte, em flagrante atitude de distúrbio no tempo de estudo, de entre os vinte e nove alunos, apenas Léon se acusou, o que mereceu ao professos este dito de espírito, no momento em que tocava para o recreio: «Oh meu rico menino, não merece ficar aqui misturado com estes companheiros tão bem comportados; vá para o recreio».
  Em Paris cursou direito e licenciou-se em 1821. Paralelamente à sua vida de trabalho e de piedade, que nunca abandonou, no meio daquela sociedade voltairiana, levou ali vida bastante mundana: bonito rapaz, de elevada estatura e maneiras distintas, rico e de boa família, foi notado na sociedade elegante como cavaqueador, dançarino e boa mão de rédea. Até que soou a hora em que Deus lhe fez compreender o lado sério da vida cristã: data dái aquilo a que, pela vida fora ficou sempre a chamar «sua conversão», nascida da curiosidade que o levou a acompanhar um jockey admitido ao seu serviço, para assistir a uma sessão da obra dos «Petits Savoyards»; fica maravilhado com a existência, naquela hora conturbada, de cristãos que sacrificam a sua liberdade à salvação do próximo, indo ensinar catequese e isto decide-o entrar para a chamada «Congregação», criadora das obras dos hospitais, das prisões, dos pequenos Saboianos e de S. Francis Régis.
  Começa então a praticar o Confissão e Comunhão hebdomadárias, esforça-se por dominar o génio, naturalmente violento, e tem rasgos de extrema generosidade e sacrifício heróico: um dia entra numa papelaria no momento em que os credores se precipitam sobre o proprietário, pobre homem, carregado de família, que suspendera pagamentos, por falta de 1.500 francos. Dupont, informado, diz apontando para a rua: «pegue ao meu cavalo e no tilbury, venda e pague»,o que foi feito.
  Do casamento nasce uma filha, mas oito meses decorridos a mãe é levada pela tuberculosa e só a fé consegue sustentar a amargura do pai. A saúde e a educação da filha levam-no a partir de França, para o que pede no Tribunal um licença, logo transformado em demissão.
  Hisitante sobre a sua vocação religiosa, aceita a vontade de Deus:será cristão leigo, disposto a levar a virtude até ao seu meio social, como excelente percusor que foi da Acção Católica. E como a cidade de Tours ficou edificada com a atitude duma das sua figuras mais marcantes, que acompanha o Viático, ajuda à Missa e toma parte em todos os actos de culto!
  Depois de uma caminhada iniciada dedicada à oração, mais adiante do texto é referido é referida a sua vocação pelos pobres: Um dia, procurado por uma pobre ameaçada de despejo e sem ter que lhe dar, entrega-lhe a preciosa caixa de rapé.E, com esse gesto, lucrou mais a perder dum vício.
   E quantos prodígios de caridade encobertamente praticados! Tal o caso duma senhora da Martinica, que perdera toda a fortuna; no entanto, não deixa de receber regularmente géneros coloniais e felicita-se pelo facto de a sua propriedade dar ainda algum rendimento... secreta delicadeza do seu conterrâneo!
  Dedica-se especialmente à visita dos presos e que magníficos frutos colhe então desse apostolado!
  Compreendendo a força da associação, então para a Conferência de São Vicente de Paulo de Tours, em 1844, onde foi o mais assíduo, o mais activo, piedoso e generoso dos vicentinos, pontualíssimo, nunca perde a oração e leitura espiritual. Não apresenta qualquer projecto sem prévio~entendimento com o presidente. Não pôde levar a cabo os seus projectos de organização metódica da visita aos presos e criação duma hospedaria gratuita para pobres, mas toma parte, durante longos anos, no ensino ministrado a cento e cinquenta rapazes e adultos, na aula mantida pela Conferência: requisita para si os mais estúpidos e atura-os com a maior paciência. Da mesma maneira ensina nas obras dos soldados, igualmente a cargo da Conferência e aí é ouvido com todo o respeito pelos soldados, admirados por verem um homem do mundo falar-lhes como ninguém jamais lhes falara.
  Auxilia muitas outras obras: o orfanato de rapazes, onde as hortaliças que encontra na rua vão despejar cestos inteiros, por ele pagos; os missionários de Bouligny (para a evangelização dos populações rurais), instituição à qual doa a sua propriedade de Bouligny; e as Irmazinhas dos Pobres, para as quais conseguiu a fundação duma casa em Tours e a quem presta assistencia constante e generosa.
  Em necessidade de render a Deus o culto que lhe é devido, cria a fundação da obra da Adoração Reparadora. Mas não só a fundou: cotou-a com camas, colchões, cobertores e roupas, sempre impecavelmente limpas, assoalhou o salão, comprou uma estufa, fornecer combustível, lâmpadas, genuflexórios, etc. Criou um registo das intenções comuns, que eram lidas antes da exposição do SSº e, nesse registo marcava com uma cruz as que eram atendidas.
  Tem uma encantadora história a primeira cruz:
  O P. Redon, Superior dos padres da Missão, precisava de quatro mil francos para acudir a embaraços de negócios de um pobre homem: falar a M. Dupont, que inscreveu a inteção no registo para a Adoração dessa noite e lhe disse: «Estou certo de manhã terá esse dinheiro». - às quatro horas de madrugada o P. Redon, dita a Missa da Adoração, tomara a diligência de Orléans: Ao clarear, um seu vizinho, velho amigo, reconheceu-o e entabulou conversa. Na muda disse ao padre: «Ainda bem que o encontrei, pois quero pedir-lhe um serviço: tenho comigo uma quantia para aplicar em boas obras e vai o meu Amigo quem disso se vai encarregar». - E entregou-lhe o dinheiro: eram quatro mil francos!.
  Os anos vão passando, abraçando a oração, que em conjunto com uma família se ajoelham esperando que uma sua filha se cure de uma doença agradecem a grande graça.
  Os últimos dias da vida são de doloroso sofrimento: a doença da gota ataca as mãos, depois as pernas, quase não pode escrever; a paralisia avança mais e mais. Suporta com inteira conformidade o sofrimento, recebe os últimos Sacramentos e responde às orações dos agonizantes, até que, chegando ao salmo »Beati immaculati in via...», um angélico sorriso lhe ilumina os traços pela última vez e descansa no senhor.
Em 1 de Outubro de 1883 o Arcebispo manda abrir o «processo informativo» sobre a heroicidade das virtudes e os milagres do servo de Deus, Léon Dupont, o que se fez imediatamente: em oitenta sessões foram ouvidas inúmeras testemunhas e as actas só foram entregues em 1888.
  Concluído o processo informativo, S.S.o Papa Leão XIII mandou, em 1891, abrir o processo de beatificação; começo os exames escritos o iniciou-se o chamado «processo de não-culto», fase em que se procura averiguar senão terá havido antecipação de culto. Entretanto houve uma longa suspensão e só em 1926 é que S.S.Pio XI permitiu que o processo entrasse na fase definitiva.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Modelo Família Vicentina – Beato Frederico Ozanam

Frederico Ozanam
(1813 - 1853)

  Não sendo lícito que um vicentino desconheça a grande figura do nosso fundador, vamos tentar recordar muito resumidamente a sua vida assim como o papel predominante desempenhado na fundação da Sociedade.
  Nascido a 23 de abril 1813 de pais cristianíssimos, que souberam comunicar-lhe o amor de Deus e lhe ensinaram a ver Jesus Cristo na pessoa do pobre, Frederico Ozanam soube conservar, mesmo na idade dos fortes paixões, um coração puro e a sua fé, mal foi afectada ao primeiro contacto com os sistemas filosóficos, por uma ligeira incerteza, imediatamente dissipada, da qual resultou para a vida inteira uma forte compaixão pelos transviados e a vontade de demonstrar que só o ensino caído dos lábios de Cristo e perpetuado pela Igreja possui os sinais infalíveis da verdade eterna e divina.
  Terminado em Lyon o curso secundário, vai seguir direito em Paris, onde encontra aquele meio agitado que se seguiu à queda dos Bourdons; sente-se triste e isolado ao ouvir as diatribes anti-religiosas lançadas por Jouffroy do alto da cátedra da Sorbonne.
  «Paris desagrada-me», escreve ele, «porque não tem vida, nem fé, nem amor». Mas ganha forças e reage ao agasalhar-se em casa do sábio Ampère, que remata assim as conversas íntimas que com ele tem sobre as maravilhas da natureza: «Ozanam, como Deus é grande, como Deus é grande!»
  Refeito então, traça o programa que dominará a actividade de toda a sua vida: residindo no catolicismo o melhor remédio para os males da sociedade contemporânea, há que demonstrar a sua verdade cientifica e histórica.
  Para se armar convenientemente, lança-se ao trabalho; estuda 15 horas por dia e aprende línguas estrangeiras, ao mesmo tempo que recruta entre os estudantes da Sorbonne colaboradores com os quais prepara a resistência à ofensiva anti-religiosa que naquela Universidade se desenvolvia. Respeitosamente, mas com firmeza, sustenta a sua opinião com uma lógica que desarma o adversário e obriga Jouffroy a dizer que a oposição, de materialista, se transformou em católica.
  Vêm, então, as Conferência da História como meios de formação intelectual e de adestramento para o combate; Delas nasce a 23 abril de 1833, na data do seu vigésimo aniversário, nasce a 1.ª Conferência da Caridade, precursora da grande obra que é a Sociedade de São Vicente de Paulo, graças à qual tantas misérias materiais e morais têm sido confortadas, por cujo intermédio tantos homens aprenderam que de nada valem os dons da inteligência se não forem acompanhados dos do coração e que o melhor remédio contra as tentações do espírito ou da carne é ainda a comunhão com o sofrimento dos nossos irmãos desgraçados.
  É também nessa época que Ozanam, apenas com 21 anos, consegue vencer prevenções e existentes contra Lacordaire que, apesar da sua inteira submissão a Roma e rompimento com a doutrina extremista de Lamennais, continua  a ser tido como suspeito; impõe o seu nome para primeiro pregador das conferência de Notre-Dame, a primeira das quais se realiza com a assistência de 6.000 pessoas e constitui um verdadeiro triunfo. Esta é, sem duvida, outra das grandes obras de Ozanam, ter levado ao púlpito de Notre-Dame, com a sua mundial projecção, grande pensadores que vão confirmando a vitalidade de Igreja.
  Diplomado em direito, defende também com o melhor brilho tese de Letras, sobre Dante e a filosofia do século XIII:a sua viva argumentação e a convicção profunda com que defende os seus pontos de vista, valem-lhe no final esta exclamação do professor e ministro Victor Cousin: «Senhor Ozanam, a sua exclamação do eloquente nunca foi excedida nesta faculdade!»
  É então nomeado professor de Direito Comercial em Lyon e pretende ser provido na cadeira, para ele bem mais interessante, de literatura estrangeira, ao que se levantam dificuldades originadas pelas suas crenças.« O Ministro promete a cátedra com condições de tomar parte no concurso aberto para a cadeira de Literatura na Sorbonne, as probabilidade de Ozanam são nulas dado haver sete concorrentes no entanto laça-se na preparação para o concurso que abrange três literaturas clássicas e quatro estrangeiras; estuda dezoito horas por dia chegando a exame extenuante e febril. O resultado é a sua classificação em primeiro lugar o que decide optar pela cátedra da Sorbonne.
  Na Sorbonne ensinou Ozanam com verdade e com paciência, levada ao heroísmo durante dose anos, não hesitou em imolar-se ao serviço da civilização e da Igreja, como entendia ser dever do homem de ciência cristão, em paridade de sacrifícios com o missionário que se deixa matar no Oriente. «Ah, meus senhores - dizia -, não sejamos cobardes a ponto de acreditar numa partilha que seria uma acusação contra Deus, que a teria feito e uma vergonha, para nós, que a aceitaríamos».
  Apaixonadamente interessou-se pelos problemas sociais e, percursor da doutrina da Igreja neste campo, defendeu o salário natural, reivindicou disposições contra o desemprego e os acidentes e reclamou a reforma para os trabalhadores.
  Nas Conferências ocupou-se, além da visita domiciliária, de obras anexas e criou a visita aos menores detidos, a dos aprendizes e a dos militares.
  Em 1852, exausto de trabalho, vai procurar no doce clima da Itália algum alívio para o seu mal. Mas as forças continuavam a declinar. Resignado, sente-se atraído para a eternidade e, posto que muito custosa a ideia da separação dos seus queridos, pronuncia o «fiat», abandonando-se inteiramente à vontade de Deus, na formosíssima oração escrita no dia do seu 40.º aniversário, da qual extraímos estas passagens:

  «... Sei que completo hoje os meus quarenta anos, mais de metade do caminho da vida. Sei que tenho uma mulher jovem e estremecida, um filha encantadora, excelentes irmãos, uma segunda mãe, numerosos amigos, uma posição honrosa, trabalhos chegados precisamente ao ponto em que iriam servir de base a uma obra há muito sonhada. E entretanto eis que sou tomado por uma doença grave, renitente e tanto mais perigosa, porque esconde, provavelmente, um esgotamento completo.
  Será então preciso deixar todos estes bens que Vós mesmo, meu Deus, me tínheis dado? Não vos contentais, senhor, com uma parte do sacrifício? Qual das minhas afeições desordenadas deverei imolar-Vos? Não aceitareis o holocausto do meu amor-próprio literário, das minhas amboções académicas, ou até mesmo dos projectos de estudo, onde talvez houvesse mais orgulho do que zelo pela verdade? Se vendesse metade dos meus livros para dar o seu valor aos pobres e congindo-me ao cumprimento das deveres do meu cargo, consagrando o resto da vida à visita dos indigentes e à instrução dos aprendizes e soldados, Senhor, ficaréis satisfeitos e conceder-me-éis a duçura de envelhecer junto de minha mulher e de completar a educação da minha filha? Talvez não o querais! Não aceitais estas ofertas interesseiras: rejeitais os meus holocaustos e os meus sacrifícios. É a mim que Vós quereis. Está escrito no começo do livro que devo fazer a Vossa vontade. E eu disse: «Es-me aqui, Senhor».
  «Dar-me-eis a coragem, a resignação a paz da alma, e aquelas consolações exprimíveis que acompanham a Vossa presença real. Far-me-eis encontrar, na doença uma fonte de merecimento e de bênção, bênçãos que fareis recair sobre minha Mulher, sobre minha filha e todos os meus, aos quais as minhas obras aproveitariam menos do que os meus sofrimentos».

  Regressando a França, agrava-se a doença e ao passar em Marselha, o fim parece iminente. Ozanam encaro-o com a maior serenidade e responde com simplicidade aos sacerdote que i acompanhava, recomendo-lhe que tivesse confiança em Deus: «Como poderia temê-Lo, se O amo tanto!» E murmurando: «Meu Deus, meu Deus, tende compaixão de mim», expirou.
  . . . Era o dia 08 de Setembro, 1853 dia da natividade de nossa Senhora..
  Paris reclamou o seu corpo, que jaz sepultado na cripta da Igreja des Carmes.
  Não é para admirar que a condição da alta espiritualidade da sua vida, toda ela dominada pelo pensamento da defesa da Religião, com inteira submissão ao Pontífice, a sua extrema caridade, assim como a evidente bênção de Deus sobre as sua obras, tenham feito nascer a ideia da beatificação de Ozanam. Com o apoio do Cardeal-Arcebispo de Paris e do Cardeal-Protector da Sociedade, foi proposto a causa a 15 de Março de 1925 e feito já o exame aos seus numerosos escritos, nos quais nada se encontrou que obstasse ao prosseguimento do processo. Assim, Sua Santidade João Paulo II assinou o Decreto de Beatificação em 25 de Junho de 1996 e foi solenemente beatificado em Paris, no dia 22 de Agosto de 1997, durante o Encontro Mundial de Jovens, a pedido do Santo padre, como exemplo para a juventude.
  No mesmo dia foi declarada Doutora da Igreja, Santa Teresa de Lisieux.

      


terça-feira, 18 de agosto de 2015

Modelo Família Vicentina: - Irmã Rosália Rendu

Irmã Rosália Rendu
(1785 - 1856)

  Impossível fazer a história da Sociedade de São Vicente de Paulo sem citar o nome desta «Filha da Caridade», tão notável foi o papel por ela desempenhado na entrada em exercício da primeira Conferência da Caridade e, mais tarde, no seu desdobramento, que deve ser tomado como o acto que marca a formação da Sociedade.
  Ficaria, pois, certamente incompeta a galeria dos nossos modelos vicentinos sem a inclusão do nome da Irmã Rosália, iniciadora dos nossos fundadores na prática da Caridade dentro do espírito de São Vicente de Paulo. Foi, de facto, ao seu grande coração, experimentado conselho e profundo conhecimento do miserável e revolto bairro de Saint Marceau, em Paris, que Ozanam e os seus companheiros recorreram nas dificuldades dos primeiros passos; e ela apressou-se a guiá-los até à morada dos pobres, deu-lhes os primeiros vales, conseguiu recursos financeiros e, melhor que tudo isso, prestou-lhes os conselhos mais valiosos, sempre cheio de respeito pela pessoa do pobre, numa admirável lição de recristianização pelo amor e pelo exemplo da sua vida.
  A base do ensinamento que ministrava nas reuniões, que no fim dum dia de trabalho tinha com os primeiros vicentinos a quem chamava «seus filhos», girava sempre à roda do amor aos pobres; da misericórdia de que, a exemplo do Divino Mestre, se devia sempre usar para com os seus defeitos, atribuíveis às privações que passem e à falta de educação; do apreço em que eles tinham o carinho que se lhes dedicasse, ao qual eram bem mais sensíveis do que ao auxílio monetário.
  Nestes fundamentos assentou o espírito da Sociedade, logo fixado nas suas regras e pode-se dizer que da Irmão Rosália recebemos a técnica da visita domiciliária.
  Mas foi também decisiva a sua opinião em favor do desdobramento da primeira Conferência, onde o excessivo número de vicentinos já não permitia regular rendimento. A ideia da separação e corte de tão agradável intimidade das reuniões, não podia porém ser encarada por grande número deles, que obstinadamente defendiam a unidade..
  Foi preciso que um dos proponentes da divisão exclamasse: «Esta opinião não é minha; é da Irmã Rosália». Tanto bastou para que se calassem todos os protestos e para que fosse acolhida com respeito a ideia da divisão. Podemos pois afirmar que ela foi, neste passo, o porta-voz da Providência, que contrariamente ao pensamento dos nossos fundadores, preocupados com o ideal da intimidade na Conferência, marcara nos seus desígnios a universal projecção da obra, só possível da multiplicação dos seus núcleos.
  Impunha-se tornar bem conhecida dos vicentinos a intenção directa da Irmã Rosália na fundação da Sociedade, mas tornar-se também necessário dá-la a conhecer sob outros aspectos, por alguns apontamentos da sua vida, que mostram o sublime grau de heroicidade do seu amor ao próximo, que mereceu a introdução da causa de beatificação e que cabalmente explicam o elevado prestígio de que gozou entre os primeiros vicentinos.
Criada, juntamente com mais três irmãs, num solar da província, em França, por sua mãe, que muito cedo enviuvara e repartia o tempo entre a educação das filhas e o socorro aos pobres da vizinhança, Joana Rendu desde muito nova viveu as constantes inquietações e gravíssimos riscos do período do Terror, em que a sua corajosa mão não hesitava em salvar a vida, embora com os riscos da própria, a quantos membros do clero e da nobreza ali procuravam refúgio.
  Que impressão não teria feito aos sete anos de Joana acordar uma madrugada em sobressalto e ver o criado Pierre, admitido ao serviço poucos dias antes, celebrar Missa no seu próprio quarto! Era o bispo de Annecy que, perseguido, se acolhera àquele hospitaleira casa disfarçado de criado. 
  Viveu assim desde criança o drama daquela sombria hora e, temperadas as energias no corajoso exemplo da sua mãe, longe de se atemorizar, compreendeu a necessidade de se robustecer para a grand eluta que seria a sua vida inteira.Aos quinze anos teima de tal maneira em fazer um estágio, como praticante de enfermeira no hospital de Gex, que consegue ser admitida: e, é aí, no meio de tantas dores e tanta miséria, que sente o chamamento de Deus para avida religiosa. Mais uma vez consegue vencer a resistência da mãe, mal segura da consistência da vocação em tão tenra idade, com estas palavras decididas: «Amar-se-á menos a Deus, porque se é jovem?. Naqueles anos terríveis do Terror, em que, a cada minuto, arriscavas as tuas e as nossas vidas para dar guarida aos perseguidos, consideraste acaso que os teus filhos eram demasiado novos para sustentar as possíveis consequências da tua caridade, se alguém nos denunciasse?»
  Assim vai fazer o noviciado e, aos vinte oito anos, Joana Rendu, agora a Irmã Resália, é Superiora da Casa das Filhas da Caridade no bairro da miséria e do vício da Saint Marceau, em Paris. E aí começa a sua espantosa tarefa de recristianização pela caridade, que as Conferências de São Vicente de Paulo se proporão seguir. Obtido o subsídio de particulares e do Município, organiza os socorros: cria uma rouparia, uma farmácia, o serviço de vales de pão e diversas outras formas de socorros e parte à conquista das mansardas. Conquista, pelo amor de Cristo na pessoa dos pobres, aos quais assiste em toda a sorte de dificuldades e dores, curando as suas chagas, levando-lhes o indispensável em géneros ou roupas, congraçando-as (fazer as pazes), perdoando-lhes os erros e vícios e com eles chorando, protegendo-os quando perseguidos, fossem quais fossem os ideais.
  Nesta acção tão intensa e tão arriscada consumiu a sua vida, tornando-se uma das figuras mais extraordinárias e mais populares de Paris. No ano de 1833 sucediam-se as revoltas; no bairro de Saint Marceau levantavam-se constantemente barricadas e o povo batia-se ferozmente contra as tropas regulares. Então a Irmã Rosália improvisava socorros e não receava expor-se percorrendo as barricadas e esforçando-se por acudir a todos, sem distinção de partidos.O Prefeito da polícia de paris passa um dia mandado de captura contra ele, por protecção a um oficial da Guarda, comprometido com revolucionários; o oficial que recebe a ordem dispõe-se a cumpri-la, mas vai prevenindo o Prefeito de que todo o bairro pegará em armas para defender a Irmã Rosália. Então é o próprio Prefeito que se propõe ir lá pessoalmente, pois quer conhecer que razões haverá para tanta dedicação.
Enquanto, por não ter sidi reconhecido, é convidado a aguardar a sua vez, tem ocasião de assitir emocionado ao desfile duma multidão de miseráveis, que vinham ali expor as suas dificuldades e pedir socorro e conselho, Interrogado finalmente sobre o motivo da sua presença, comunica então que acabava de rasgar um mandato de captura contra ele, mas vinha ali aconselhar-lhe que não voltasse a criar situações difíceis. Ao que a Irmã Rosália responde não poder prometê-lo, porque uma Filha de São Vicente de Paulo não tem o direito de faltar à caridade, quaisquer que sejam as consequências; mas promete-lhe também que, se ele alguma vez, perseguido, lhe pedir socorro, tudo fará para o salvar!
  Num desses frequentes e sangrentos tumultos, um oficial da Guarda, à frente da sua companhia, assalta a barricada que ficava mesmo junto à porta do Convento; mortos parte dos homens e postos em fuga os restantes, encontra-se só, e é feito prisioneiro pelos populares; mas encontrando aberta a porta, consegue entrar no Convento, onde é perseguido pelos amotinados, sedentos de sangue.
A Irmã Rosália barra-lhes a passagem, perguntando se teriam coragem de o matar ali, ao que respondem que o levarão primeiro para fora. Resolutamente a Irmã Rosália, faz-lhe frente; juntam-se-lhe outra Irmãs; porém a multidão sublevada, impacienta-se com aquela muralha de cornettes brancas;apontam-se espingardas, mas então a Irmã Rosália roja-se diante daqueles homens e suplica: «Há cinquenta anos que vos consagrei a minha vida; por tudo quanto fiz às vossas mulheres e aos vossos filhos, peço-vos a vida deste homem!»
  Os revoltosos foram debandando lentamente,alguns deles com as lágrimas nos olhos e então o oficial perguntou: «Quem sois?» - Quase nada, respondeu ela: «uma Filha da Caridade».
  Noutro dia correu pais sob o tiroteio, saltando de barricada em barricada, à procura do corpo dum oficial casado com uma sua amiga de infância; e doutra vez ainda atravessou entre os combatentes gritando: «Acham que posso viver enquanto os meus filhos se matam uns aos outros?» - «Vão matá-la, Irmã. Não atirem!» gritavam vozes aflitas. e a luta cessou naquele sector.
  Os episódios apontados põem em evidencia o extraordinário domínio imposto pela força da Caridade: deu-se inteiramente àquelas almas, cujos defeitos e vícios olhou com-passivamente e em favor das quais se multiplicou em socorros, benefícios e serviços de toda a ordem, arriscando a vida debaixo de fogo e também sob o contágio como, por exemplo, no combate à epidemia de cólera que dizimou o bairro de Saint Marceau, em que o grupo de Ozanam colaborou nos socorros por ela organizados. Tiveram então ocasião de observar como a desconfiança, com que a princípio eram recebidos, cedia lugar á maior franqueza - portas abertas, rostos desanuviados - desde que declaravam vir do mundo da Irmã Rosália.
  No dia em que morreu a Irmã Rosália - Legião de Honra, cantada em versos populares pelos pobres de Paris, que a amavam como à mãe - todo o bairro de Saint Marceau desfilou diante do seu corpo e acompanhou-a a enterrar. pais inteiro se comoveu e sacerdotes vindos de toda a França celebraram Missa junto do seu cadáver. A administração Municipal ergue-lhe um busto no átrio do seu palácio, busto que, vinte e quatro anos mais tarde, viria a ser ridiculamente apeado por uma vereação facciosamente anti-clerical, que o considerou como um desafio ao livre pensamento!
Que este pálido relato ajude a criar entre os vicentinos interesse pela figura da extraordinária heroína da Caridade que foi a Irmã Rosália, dispondo-os a imitar as suas sublimes virtudes e também a juntarem as suas orações para pedir a Deus que possamos, em breve tempo, ver sobre os altares mais uma santa da família de São Vicente de Paulo.             


Modelo Família Vicentina: - Santa Luísa de Marillac

Santa Luísa de Marillac
1591 - 1660

  Luísa nasceu em 12 de Agosto de 1591, hoje passados (424 anos), filha natural de Luís de Marillac, senhor de Ferrières, aparentado com a nobreza francesa, cujas posses permitiram dar à filha uma infância tranquila. A menina aos três anos foi para o Convento Real de Poissy, em Paris onde recebeu uma educação refinada, quer no plano espiritual, quer no humanístico.
  Porém, seu pai morreu quando ele tinha treze anos, sem deixar herança e, felizmente, nem dívidas.. Nessas circunstâncias Luísa foi tirada de Convento, pela tia Valença, pois os Marillac não se dispuseram custear mais sua formação. Ele desejava dedicar a sua vida a Deus, para cuidar dos pobres e doentes, mas agora com a escassez financeira teria de esperar para atingir esse objectivo.
Durante dois anos viveu numa casa simples de moças custeando-se com trabalhos feitos em domicílio, especialmente bordados Ela, tentou ingressar no mosteiro das capuchinhas das Filhas da Paixão que acabavam de chegar em Paris, mas foi rejeitada pela aprarência de saúde débil, imprópria para a vida de mosteiro. Depois disso viu-se constrangida a aceitar um casamento que os tios lhe arranjara. Foi com António de Gràs, que trabalhava como secretário da rainha. Com ele teve um filho, Miguel António. Viveu feliz, pois o marido a respeitava e amava a família. E se orgulhava da esposa que nas horas vagas cuidava dos deveres de piedade, mortificando-se com jejuns frequentes, visitando os pobres, os hospitais e os asilos confortando a todos com seu socorro. Até que ele própio foi acometido por grave e longa enfermidade e ela passou a se dedicar primeiro a ele sem abandonar os demais. Mas com isso novamente os problemas financeiros voltaram.
  Nesse período teve dois grandes conselheiros espirituais: Francisco de Sales e Vicente de Paulo, ambos depois declarados Santos pela Igreja. Foi graças á direcção deles, que pôde superar e enfrentar os problemas que agitavam o seu quotidiano e a sua alma. Somente sua fé a manteve firme e graças à sua força, suplantou as adversidades, até o marido falecer, em 1625 e Miguel António foi para o seminário.
  Só então Luísa pôde dedicar-se totalmente aos pobres, doentes e velhos. Isso ocorreu porque Vicente de Paulo teve a iluminação de colocar-la à frente das Confrarias de Caridade, as quais fundara para socorrer as paróquias da França e que vinham definhando. Vicente encarregou-se de visitá-las, reorganizá-las, enfim dinamizá-las e ela o fez durante anos.
Em 1634 Luísa, com ajuda e orientação de Vicente de Paulo, fundou a congregação das Damas da Caridade, inicialmente com três senhoras da sociedade, mas esse núcleo se tornaria depois uma Congregação de Irmãs. Isso o porque serviço que estas Damas prestavam aos pobres era limitado pelos seus deveres familiares e sociais e pela flata de hábito aos trabalhos humildes e fatigantes. Era necessário colocar junto delas, pessoas generosas, livres e totalmente consagradas a Deus e aos pobres. Mas na Igreja não existiam porque a vida de consagração para as mulheres estava concebida apenas como vida de clausura. Então, Vicente e Luísa, em 1642 ousaram e, criam as Irmãs dos Pobres, as Filhas da Caridade, a quem foram confiados os doentes, os enjeitados, os velhos, os mendigos, os soldados feridos e os condenados às prisões..
  Nascia um novo tipo de Irmã, com uma missão inédita para aqueles tempos: uma vida consagrada em dispersão pelos caminhos do sofrimento humano, assim estava criada a Consagração das Irmãs Filhas da Caridade, em 1642. Na qual Luísa fez os votos perpétuos, sendo consagrada pelo próprio Vicente de Paulo. A obra, sob a direção dela foi notável. Quando Paris assolada pela guerra e peste, em 1652, as Irmãs chegaram a atender quatorze mil pessoas, de todas as categorias sociais, sendo inclusive as primeira Irmãs a serem requisitadas para o atendimento dos soldado feridos, nos campos de batalhas.
  Luísa, morreu em 15 de Março de 1660. Foi beatificada em 1920 e canonizada pelo Papa Pio XI, em 1934. Suas relíquias repousam na Capela da Visitação da Casa matriz das Irmãs da Caridade, em Paris, França. Santa Luísa de Marillac, foi proclamada Padroeira das Obras Sociais e de todos os assitentes sociais, pelo Papa João XXIII, em 1960.
    


Modelo Família Vicentina: - São Vicente de Paulo

O Conselho de Zona Gaia Norte, num contexto formativo e de espiritualidade vicentina, leva a efeito a publicação e biografias resumidas, de vários vicentinos, uns fundadores outros seus devotos seguidores da SSVP, que ao longo dos anos deram o seu testemunho de vida vicentina mostrando à sociedade por onde passaram e acima de tudo o seu testemunho de vida vicentina em prol dos mais desprotegidos e, que teve como seu fundador; S. Vicente Paulo. A árvore genealógica que disponho em escritos, vai desde as datas de nascimento até datas de falecimento - 1581 a 1980.
Quem estiver interessado nestas narrações biográficas podem acompanhar este blogue a partir da primeira publicação, que vou tentar terminar, até ao Dia da S.S.V.P., a ter lugar a 25 de Outubro de 2015, no Salão Paroquial de São Cristóvão de Mafamude e organizado pelos dois conselhos de Zonas da Vigaria de Gaia Norte e Sul. 

 "... Temos Conferências em Québec e no México. Temo-las em Jerusalém. Há com certeza uma conferência no paraíso, pois há mais de mil dos nossos, desde há vinte anos que existimos que tomaram o caminho duma vida melhor"
                                                                                   (Da última carta de Ozanam escrita ao R. Pº Pendola em 19 de Julho de 1853,sete semanas antes da sua morte)                                                                                     


 São Vicente de Paulo
       (1581 - 1660)

  Ozanam quis colocar as conferências sob o patrocínio de S.Vicente de Paulo: «modelo na terra, protector no Céu».
Foi nas Landes, em Pouy, nos arredores de Dax, que nasceu a 24 abril de 1581 o jovem Vicente de Paulo terceiro dos seis filhos de modestos lavradores.
Dos longos dias passados no meio da natureza, na guarda de rebanhos, lhe veio o gosto da solidão e do reconhecimento.
  A inatâncias do pároco e do juiz, impressionados com a viva inteligência de Vicente, mandou-o o seu pai para o colégio em Dax, onde fez rápidos estudos e se definiu a sua vocação.
  Ordenado em 1600 com vinte anos incompletos, torna-se sucessivamente capelão de Margarida de Valois, Pároco de Clichy,que transforma em paróquia modelo e preceptor na família de Filipe Manuel Gondi, general das galés, ao qual acompanha nas suas deslocações: verifica então o que é a miséria dos lavradores e a insuficiência do clero rural e daí lhe nasce o sentimento de necessidade de evangelizar os meios rurais.
  É nomeado pároco de Chatillon-les-Dombes, aldeia moralmente abandonada, numa igreja deserta, com uma população miserável, sob a influência protestante. Em pouco tempo tudo está transformado, moral e materialmente, prestando-se a população a auxiliá-lo. Funda então a primeira «Confraria de Caridade» destinada a «ajudar o corpo e a alma a bem morrer ou a bem viver».
  De novo em casa dos Gondi, que o reclamam, põe em pé a Congregação a Missão, destinada a evangelizar aldeias, a qual em pouco anos cobre grande parte do solo da França. A completar a acção das Missões, desenvolve as Confrarias de Caridade, para o que pede a colaboração de Luísa de Marillac, que com ele colaborá até à morte e recruta as Damas de Caridade.
  Entretanto, como capelão das Galés, Vicente de Paulo toma contacto com as prisões, verdadeira imagem do inferno e consegue melhorar a sorte dos desgraçados presos, transferindo-os para lugar habitável, organizando visitas e socorros, tanto materiais como morais.
  Para assegurar permanência nos socorros aos deserdados, instituiu as «Filhas da Caridade», origem das «Irmãs de S. Vicente de Paulo».
  Ao mesmo tempo dedica os seus esforços à espiritualização do clero: daí nascerem, em diversos seminários, os «exercícios dos ordinandos» e também as «Conferências das Terças-Feiras», destinadas aos futuros Bispos, frequentadas, entre outros, por Bossuet, que a Vicente de Paulo aplicava o dito do Apóstolo: «Se alguém fala, que as suas palavras sejam as palavras de Deus».
  Junto de Luís III, de Ana de Ástria, de Richelieu e de Mazarino, desenvolve notável acção na escolha de superiores eclesiásticos e a sua actividade torna-se prodigiosa para acudir a todos os males: cria o orfanato, instrução, aprendizagem e colocação de crianças expostas; organiza um vasto socorro às províncias devastadas pela guerra, vencendo a fome, as epidemias e levantando ruínas.
  Inteligência fulgurante, que lhe apresenta a raiz do mal a combater, vontade firme e privilegiado espírito de organização; tudo isto ao serviço dum coração a transbordar de amor fraterno, constitui o mais admirável exemplo terreno da «Caridade nas Obras».
  Falecido em 27 de setembro de 1660, foi canonizado em 16 de Junho de 1737, vindo a ser proclamado por Leão XIII patrono das obras de caridade.
  Tal a figura do extraordinário santo a quem Ozanam foi buscar para patrono e modelo das Conferências, que são instadas a imitar o seu amor ao próximo e o seu zelo eminentemente operoso, com raiz na mais intensa piedade.